sexta-feira, 19 de outubro de 2012

Meus últimos dois tostões ao Partido dos Trabalhadores


racha do pt
Tenho vontade de pontuar com precisão esse assunto há algum tempo. Tratar do contraste entre o respeito que tenho pelo papel histórico do Partido dos Trabalhadores e meu desconforto ante ao PT atual. Essa massa amorfa, mergulhada na soberba do fisiologismo, que ainda se vale daquela referência histórica para gozar de uma blindagem ante a qualquer crítica.

Pra começar, preciso frustrar as expectativas do antipetista visceral. Aquele que pensa em vir aqui pra me ver usando termos cunhados por um Reinaldo Azevedo da vida. Não é o caso, não é isso que farei, nem nesse texto nem num próximo. Tenho uma reputação a zelar. 

Mantenho uma tremenda desconfiança sobre esse perfil do antipetista nervoso, chiliquento, que sai esbravejando termos como “petralhas”, falando em mensalão como se fosse a obra inaugural da corrupção no Brasil ou mesmo “o maior esquema” de corrupção da história. Até porque é esse tipo de crítica alienada e insipiente que fortalece a imunidade de um PT que merece, e requer, uma crítica mais apurada.

Ao mesmo tempo em que é preciso reconhecer avanços em políticas econômicas e sociais operados pela mudança de prisma na passagem do governo tucano para o governo petista, é chegada a hora de perceber que a fórmula estagnou, conforme já se podia prever que iria estagnar.

Sim, o governo Lula tirou o país de um caminho para a catástrofe. No plano internacional, substituiu a lógica do aprofundamento na subserviência por uma busca de relações bilaterais com outras nações em desenvolvimento, o que serviu para aquecer e para proteger nossa economia enquanto grandes potências passavam por crises profundas. Aqui dou meu primeiro tostão.

Além disso, no campo das políticas sociais, medidas de simples assistencialismo serviram para retirar um grande número de famílias da miséria absoluta, por efeito dos programas de bolsas que uma oposição raivosa passou a demonizar. Aqui dou o segundo e último tostão.

Por outro lado. o engomadinho que demoniza programas assistenciais e acha que o faminto pode esperar enquanto se pensa numa saída definitiva e genial para a fome é o tipo de figura que reforça a blindagem do PT, que possibilita ao partido o uso do argumento de que toda a oposição é preconceituosa e elitista.

Na economia, é preocupante observar que as vantagens advindas da quebra de paradigma na política internacional vêm se esgotando e que o país não aproveitou a bonança para cuidar de desenvolvimento de fato. O tal PAC não mostra a que veio no sentido de desenvolver infraestrutura, a produção científica não é incentivada. O país não prepara caminho para o progresso de fato.

As políticas para a educação não passam de gambiarras para mascarar estatísticas (ENEM, cotas, etc) sem que o quadro calamitoso da escola pública seja reconhecido e enfrentado. Os problemas da universidade são tratados apenas pelo viés quantitativo, do aumento do número de vagas. Enquanto isso, o PROUNI é um projeto de privatização silenciosa do ensino superior, aplaudido pelo Movimento Estudantil que sempre defendeu “educação pública e gratuita de qualidade”. Afinal, a UNE faz parte da claque do aplauso incondicional ao governo.

Na saúde, pra quem gosta de números, basta mencionar que o SUS perdeu 42 mil leitos entre outubro de 2005 e junho de 2012. Faculdades de medicina no país enfrentam o dilema entre o sucateamento ou a privatização dos hospitais universitários.

Enquanto se implementaram programas assistenciais de urgência e a economia cresceu de maneira modesta, mas estável, criando mais vagas de trabalho formal, a grande “transformação social” da qual o PT gosta de se vangloriar se baseia na mudança de padrões de consumo do trabalhador, que agora pode comprar eletro-eletrônicos vindos da China graças a uma grande capacidade de endividamento.

Ou seja, num quadro em que pouco ou nada se faz pela saúde ou pela educação, a maior vitória esbanjada pelo governo consiste em propiciar o consumo de tranqueiras pelo trabalhador que mantém seus filhos numa escola de quinta categoria, numa família em que, se alguém adoecer ou sofrer um acidente, terá de enfrentar o calvário do SUS, mas tem TV de LCD e paga por ela uma prestação a perder de vista.

Nesse quadro, a maior parte do “progresso” do qual o governo se vangloria é uma ilusão. Será possível que a utopia progressista almejada pelo Partido dos Trabalhadores se limita a uma réplica fuleira do “american way of life” falsificada no Paraguai ou trazida da China, comprada num crediário com parcelas a perder de vista?

Enquanto isso, na economia, seguimos sedimentando nossa vocação para sermos a seção hortifrútis do mundo globalizado. Não se fala em incentivo à pesquisa científica e o país se deu ao luxo de passar o todo o segundo semestre de 2012 com as universidades federais paradas porque o governo “não teve tempo” para negociar com os professores e técnicos em greve.

Ao contrário do antipetista visceral, reconheço a grande importância que teve o Partido dos Trabalhadores na vida política do país. O PT, enquanto grande partido e enquanto referência de esquerda, serviu para trazer à baila discussões que não entrariam em pauta por obra de nenhum outro partido. Ou pelo fato de a velha direita reproduzir a mesquinharia de uma elite retrógrada, ou pela menor expressividade dos demais partidos de esquerda.

O problema é que aquele PT não mais existe. O que está aí é um partido que, pela via do pragmatismo, enveredou no fisiologismo e perdeu a identidade há bastante tempo. Enquanto isso, continua gozando dos benefícios daquela referência histórica que não mais existe.

O resultado é um PT que virou puta, que abraça o Maluf em São Paulo, que está em campanha coligado à Roseana Sarney no Maranhão, mas que se faz de donzela virgem na hora de criticar as alianças e coligações de qualquer outro partido dito de esquerda no país.

Para piorar, a trupe do antipetismo nervoso, que vai da dona de casa leitora da Veja, passando pelo “internauta” assíduo do blog do Reinaldo Azevedo, chegando até a ala raivosa e perigosa das viúvas da ditadura militar, ajudam na construção de uma blindagem para o PT segundo a qual toda e qualquer oposição é preconceituosa, elitista, e golpista. O enorme barulho feito por esse manicômio que é a direita brasileira acaba por abafar qualquer crítica que se pretenda fazer ao governo.

Como já tratei em inúmeros outros textos aqui, boa parte das lágrimas derramadas por uma oposição patética que acusa o PT de conduzir inquebrantável projeto do hegemonia representam o choro de grupos desprovidos de capacidade crítica, para a qual o senhor José Serra e o falecido PSDB podem ser tomados como referências máximas.

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